terça-feira, 27 de outubro de 2009

O Leitor

O interessante do filme de Stephen Daldry é que, diferentemente de tantos filmes sobre o holocausto, repetitivos, diga-se de passagem, embora eu goste de alguns deles, o Leitor não se propõe a mostrar, em cenas deprimentes e desumanas, a barbárie por que passaram os judeus perseguidos pelo nazismo. De fato, o Leitor não é um filme sobre o holocausto, mas uma tentativa de entender e mostrar o que se passou na Alemanha nazista de Hitler. Tampouco é a história de uma analfabeta tentando encobrir a vergonha de não saber ler. Também não é a história de um amor que marcou a vida de duas pessoas para sempre. O filme é muito mais que isso. A personagem de Kate Winslet, Hanna, é simbólica e representa, independentemente da sua condição de analfabeta, a grande parcela de alemães que se submeteu às leis de Hitler. A pergunta é: Por que? Por que os alemães cumpriram as leis, a ferro e fogo, sem se rebelarem contra o status quo? O que aconteceu ali, naquela Alemanha? Até onde nosso comportamento é pautado por leis ou valores morais? E como algumas vezes a lei embaça um possível olhar sobre questões éticas e morais. A personagem do filme, como se pôde ver, não é um monstro, mas uma pessoa comum, também vítima de uma tirania que não foi capaz de contestar, como muitos não o foram, embora nem todos analfabetos. Em que estado de alienação mergulhou a Alemanha durante o período nazista?O Leitor é um embate entre lei e valores morais. Uma reflexão. O que verdadeiramente nos conduz? E o que devemos pretender de fato? Vingança ou justiça? E os estragos feitos? E os milhões de judeus mortos? O julgamento de uns poucos, como satisfação ao mundo, terá sido alguma forma de justiça? Simbolicamente sim, as satisfações precisam ser dadas quando se vive em sociedade. Mas devemos sempre olhar pelo outro lado da luneta, também. O povo judeu, perseguido e humilhado, teve desejo de vingança, ou justiça, ou reparação no processo de recuperação da sua dignidade e auto-estima. Os alemães que conseguiram, presos ou não, refletir e alcançar algum juízo de valor sobre suas ações tenebrosas, como foi o caso de Hanna, consumiram-se na culpa, aterrorizados pela consciência tardia de seus atos. O que o filme pretende é um pedido de perdão com direito de perdão. O que foi sutilmente sugerido pela personagem de Lena Olin, a judia que, em companhia da mãe, sofreu nas mãos de Hanna. Ilana Mather dispensou o seu dinheiro, mas guardou a sua caixinha, semelhante a que ela mesma tivera um dia, mais importante que o conteúdo. O filme é uma tentativa de reconciliação. Um ponto final. A superação de uma historia que fez mal a todos que participaram dela, perseguidores e perseguidos.